sexta-feira, 29 de abril de 2011

Do Além Túmulo

Se morrer fosse como terminar um namoro, a vida não lhe passaria na frente dos olhos, como todos dizem, isso seria um desperdício de sofrimento.
Não, no momento exato da morte, você não sentiria ou lembraria muita coisa de fato, mas em compensação, a partir desse momento você vagaria pelo mundo em forma de fantasma, relembrando-se de tudo o que aconteceu em sua vida em cada esquina que passa, em cada segundo que lhe é clicado na cabeça. Você se surpreenderia com o quanto você viveu, e, agora sim, você começaria homeopaticamente a lembrar de cada vereda, de cada detalhe, de cada situação, como que deliberadamente pra te torturar, dizendo "você está morto, você está morto".

Se morrer fosse como terminar um namoro, não haveria, portanto, vida após a morte. Tudo o que se viveria lá seriam os ecos da sua vida que acabou. E, pensando bem, ecos são excelentes metáforas nesse caso, pois nós deliberadamente escolheríamos vivê-los: ecos nos dão a ilusão de que, mesmo à distância, existe ali alguém conosco, reafirmando tudo o que falamos, fazendo companhia e disposto a estar acordado exatamente no instante em que você está, estar alegre ou triste no exato instante em que você está: mas não. Não há ninguém. Se a vida fosse como terminar um relacionamento, nós escolheríamos viver nosso postmortem no limbo.

Por fim, depois de reviver tudo e de esgotadas as possibilidades de reinterpretações excruciantes dos fatos passados, tudo perderia, então, o sentido. Você para de gritar e para de chorar, e para de falar sozinho, e para de esmurrar as paredes, e para de rasgar papéis, e então os sons cessam. Com os sons cessando, terminam-se também os ecos. E então aquele universo límbico cujas regras da física se baseiam apenas no princípio de reação newtoniana e de propagação do som no ar, aquele universo simplesmente desaparece.

O que acontece depois de lá para mim é complicado dizer. Mas quando eu chegar lá e descobrir, volto aqui e te conto.

Por Moai

6 comentários:

  1. Aaaa Dói o peito só de pensar...

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  2. Particularmente encaro melhor a morte com menos sentimentalismo e com uma certeza irrefutável: é um ponto (.) além do qual só existe espaço em branco ( VAZIO ).

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  3. Retifico, possivelmente o espaço vazio permanecerá preenchido. Afinal, foi você! quem deixou de existir, e não o entorno. Então, a locomotiva de infinitos trilhos continua seu percurso (longo e incerto) independente de quantos passageiros subam ou descem no percorrer do caminho...

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  4. Mais uma coisa, com todo respeito a Você e a Newton, é uma blasfêmia dizer que ele esse último “explicou” o universo. E tão pecaminoso quanto, é dizer que suas leis se aplicam ao universo. Nem mesmo se aplicam à universalidade mecânica dos eventos terrestres! Mas de fato, com seus olhos eternamente fechados, o universo deixa de existir – ainda que ele continue se expandido para dentro das outras 11 dimensões...

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